
Acordei cedo no dia seguinte e a van já estava me esperando na porta do hostel. Não tomei café da manhã. Na van estava um senhor Bielorrusso, o motorista e o guia Willy. Íamos fazer um bate volta ao pico Áustria.
O Pico Áustria é um dos picos mais alto da Cordilheira Real onde pode fazer trekking sem precisar escalar na neve. Está a 5315 metros de altitude e em frente é possível ver as geleiras do Condoriri, montanhas que lembram um condor de asas abertas, e a imensa laguna Chiar Khota. Normalmente as pessoas acampam na base em frente a laguna Chiar Khota e no outro dia sobem ao pico. Eu iria fazer tudo em um só dia. Seria um pouco degastante? Meu corpo aguentaria a altitude? Eu quase não havia descansado... Vamos ver...
Demorou mais de duas horas de van para chegarmos, e no caminho comprei água, chocolate, Gatorade. Foi muito caro, algo tipo trinta bolivianos. Meteram a faca em mim, mas foi a única parada na estrada.
Durante o caminho, pude ver a Cordilheira Real ao meu lado um tempão. Estava encabulado, tudo muito lindo, e hora que entramos entre as montanhas, fiquei mais encantado. Vista fenomenal, havia ovelhas, Ilhamas e Alpacas no caminho, até que a van parou em uma planície para iniciarmos a caminhada. Tomamos desayuno, chá de Coca, bolachas de sal e pão.


Caminhamos bastante, sem muitas subidas e chegamos na laguna Chiar Khota depois de uma hora e pouco. Um dos lugares mais lindos que conheci. Uma cadeia de montanhas ao meu redor, uma lagoa só para mim! Estava um pouco frio e parei para descanso. Contemplei, apreciei, admirei, aquele lugar. O que meus olhos viam era fantástico. Ainda sinto uma vontade enorme de voltar lá. Um monte de montanhas, um lago em minha frente, neve ao meu redor... Comecei a imaginar o que existiria no fundo do lago, atrás das montanhas. Pensei no tamanho de minha insignificância perante o mundo e na grande oportunidade de conhecer um lugar tão bonito como aquele. Eu sou movido ao desconhecido, adrenalina, riscos: a esse tipo de aventura. Um dia ainda largo tudo para dar a volta ao mundo... e ali, pude confirmar isso mais uma vez...


Depois de muitas fotos, começamos a subida bem devagar, cheio de pedras, coração disparava por causa da altitude, subida em ziguezague e ingrime, mas estava dando tudo certo. Depois de umas duas horas de caminhada já era meio dia e paramos para almoçar. O guia havia trazido a comida em uma marmita e começou a dividir em três pratos. Arroz, batata cozida e frango. Ele colocava com as mãos mesmo a comida em cada prato, e quando cheguei bem perto ele pegou uma colher e começou a disfarçar, colocando a comida com a colher. Até que não senti nojo e mandei tudo pra dentro, estava no meio do nada... só nos três... começou a nevar... só tomar um vermífugo ao voltar para o Brasil que resolveria... Risos.

Até que... aparece duas águias Sete Marias bem do meu lado!! Fiquei louco, e já coloquei um pouco de arroz para elas e fui fazer uma self!!! Não é todos os dias que se pode tirar foto com águias entre as montanhas almoçando. Quase coloquei uma no braço. Risos.

Nos preparamos novamente e partimos. Começou a subida... Depois de uns 40 minutos o bielorrusso que estava todo equipado, que tinha cara de atleta, logo ficou para trás. Começou a nevar forte, e esfriou bastante. A trilha ficou mais inclinada e cheia de cascalho. Apareceu muita neblina e em um determinado ponto o bielorrusso desistiu, sentiu o mal da altitude e desceu.

Quase la... Acabei subindo com o guia, bem devagar, demorou mais uns 40 min, e pude ver o topo do Pico Áustria logo em frente...
Foram quase 5 horas de caminhada até ali... entre pedras, o frio, águias, neve, mais um momento de superação... Meu corpo estava um pouco fadigado, com bastante frio, coração disparado, e mesmo assim eu tive forças e consegui chegar ao topo! Meu terceiro dia em La Paz e já estava a 5315 metros. Durante o percurso eu martelava que não poderia desistir, estava quase lá, que meu corpo aguentaria, e aguentou...
Cheguei no topo do Pico Áustria! Estava nevando e cheio de neblina, não se via nada. Entretanto, foi um dos momentos de êxtase e euforia. Uma sensação de superação, de alegria enorme por ter conseguido chegar ao topo daquela montanha. Comecei a querer chorar e me vi em prantos. Eu gritava e gritava e só o guia ouvia. Extravasar aquela sensação de dever cumprido foi demais. Ainda busco sentir aquela sensação novamente em novos desafios.
Meu vídeo:

Eu e o guia, detalhe da neve... O guia quase não conversava, muito menos me entendia. Meu portunhol ainda estava horrível. Comecei a agradecê-lo e também agradecer a Deus por ter me dado forças e esse privilégio de estar ali em cima da montanha.
Não estava conseguindo tirar fotos, meu celular havia congelado. Coloquei ele literalmente no saco e depois de um tempinho ele ligou e consegui bater algumas fotos no topo! Estava super feliz por ter me superado e conhecido um pouco mais meu corpo e meus limites. Até então, eu achava que conseguiria tudo e todos os desafios, e esse não foi muito fácil.
Começou a nevar forte, e com muita neblina, com o coração na mão, o guia mandou descer rapidamente. Comi um carboidrato em gel, chocolate, Gatorade, castanha de caju, balinha, água, barra de proteína durante o percurso. Estava um pouco mole e cansado e a descida foi mais rápida. Meus pés e pernas estavam bem fadigados. Fui o último a chegar na van e dormi no caminho de volta a La paz. Comi um Burguer King, voltei para o hostel, tomei um banho quente bem demorado, e fui dormir... Nada de balada... Dia seguinte tinha a Estrada da Morte para fazer!